
Todos os direitos reservados
“Todo o trabalho criativo de Carol tinha por base o conhecimento, através de pesquisas qualitativas, que ele fazia seguindo o perfil dos consumidores de seus clientes e telespectadores da Globo Recife. E foi por isso que resolvemos transferir a mídia da Casas José Araújo, do horário noturno para o patrocínio do Jornal Hoje, se não me engano, por mais de 12 anos. Neste período de criação em conjunto de mídia e do conteúdo, a Itaity Publicidade foi a primeira agência, em tempos de crise como os de hoje, a valorizar a importância do anúncio como saída fundamental para superar as dificuldades. E, com essa atitude, tornou-se a primeira agência a anunciar em TV no Brasil”, relembra Cleo Nicéias, presidente da Asserpe (Associação das Empresas de Radio e Televisão de Pernambuco).
Em relação a este cliente, todos têm algum desses trabalhos em suas lembranças por serem uma peça inesquecível. Passaram-se mais de três décadas e as propagandas com jingles da José Araújo até hoje lembram que a rede era a casa onde “quem manda é o freguês”. “Tenho viva em minhas lembranças as campanhas da Itaity Propaganda, liderada pelo publicitário pernambucano Carol Fernandes, cujo trabalho tinha como mote a mediação da cultura local popular na mídia publicitária para o estímulo ao consumo. Suas campanhas, memoráveis, mostravam-se no nível do sensível e do cotidiano como belas, bem humoradas e por isso memoráveis espetáculos estéticos”, comenta Eneus Trindade, professor da Escola de comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo.
Com isso, a Casas José Araújo ficou na memória de toda uma geração por conta da criatividade de suas campanhas, além de se tornar referência em estudos acadêmicos. A marca fez história na cena da propaganda no Nordeste e a agência ficou marcada provavelmente para sempre. “Os comercias das Casas José Araújo (loja de tecidos e confecções de cama, mesa e banho) mostravam a força da musicalidade local, do folclore, a beleza do lugar e a simpatia das gentes. Além disso, esses comerciais ritualizavam o horário do almoço, pois este anunciante patrocinava o jornal da TV Globo do meio dia. Essas mensagens foram constitutivas de um imaginário cotidiano da minha geração”, diz Trindade. E os trabalhos para a marca não só se destacaram pelos elementos que reforçavam a força da cultura e do desenvolvimento da região, como também anteciparam uma tendência que se intensificou posteriormente quando se percebeu que o melhor caminho para conquistar e fidelizar o pernambucano era regionalizar a comunicação.
Resgatando o lado divertido da festa de momo, o comercial foi gravado no ano de 1992 e mostrava bela jovem numa sacada de um dos casarões de Olinda, cidade patrimônio histórico e cultural da humanidade, nas proximidades do Mercado da Ribeira. As imagens insinuantes da atriz pernambucana (Veruska Luna, que tinha quase 14 anos na época) aliada à música transformaram o filme em um sucesso e fizeram do jingle um grande hit do carnaval de 1993, em Pernambuco. “Carol Fernandes era um artista. Cronista que transformava realidade em emoção. E emoção em significado, tanto para clientes quanto para consumidores. Criava peças publicitárias como se fossem um curta-metragem. Visionário de olho afiado, conseguiu perpetuar, por meio dos anúncios que criou, o comportamento de uma época e entendeu, antes de muitos, que publicidade boa é aquela que toca o coração. Por isso virou referência, fez escola e virou história”, comenta Beatriz Ivo, diretora de jornalismo da TV e Rádio Jornal.
De forma muito particular, os projetos carregavam muitos simbolismos arraigados nas tradições nordestinas, desde as comemorações profanas até as religiosas, como na emblemática campanha com a qual prestigiou as comemorações da Nossa Senhora da Conceição, produzida em 1978. As imagens mostravam de forma lúdica a fé do povo pernambucano e o jingle reside ainda hoje no imaginário popular: “Senhora da Conceição. Minha Mãe, Minha Rainha. Dai-me a vossa proteção, minha querida madrinha. Vela acessa, subo o morro pra pagar minha promessa. Vou vestir azul e branco, pra pagar eu tenho pressa. As Casas Zé Araújo fazem essa louvação. Com o povo rendem graça à Virgem da Conceição”. “Carol Fernandes é um ícone da propaganda pernambucana. Tudo o que ele desenvolveu e idealizou há mais de 30 anos continua válido para os dias atuais. Isso mostra o quanto Carol era um homem com visão de futuro, que sempre esteve à frente do seu tempo”, acrescenta o publicitário Queiroz Filho, CEO do Grupo Duca, holding que reúne agências como a BG9 e Ampla PE e ES.
As incríveis melodias e as imagens cheias de referências das tradições de um povo rico, animado, fervoroso e confiante transformaram as campanhas de Carol Fernandes, da sua Itaity e da Casa José Araújo, cliente mais consciente da força da propaganda para reforçar a marca, um dos maiores cases do mercado de propaganda da região. De maneira emblemática e fazendo menção à cultura, destacou com muita emoção a relação das marcas com o consumidor, e ainda antecipou há trinta anos estratégias e conceitos de comunicação que o mercado passou a conhecer posteriormente. Seus comerciais construíram histórias deliciosas e incríveis, histórias que representaram e reforçaram o cerne das marcas: branding, storytelling, entre muitas outras apostas nas quais investiu com pioneirismo. “Por mais que eu pudesse testemunhar algo sobre o profissional Carol Fernandes seria um fato insignificante diante da importância dele para o desenvolvimento da comunicação e da propaganda em Pernambuco. É por essas e por outras que, para mim, Carol Fernandes não é passado. É futuro. E, as vezes me pergunto: será que não foi ele, institivamente, o primeiro a usar como conceito o neuromarketing na propaganda?”, enfatiza o amigo Cleo Nicéias, que dividiu com o célebre publicitário diversas histórias e momentos inesquecíveis.
* Matéria roduzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Junho/ 2016, número 194

