gaudencio-torquato-dscn4600A comunicação nasceu praticamente no berço para o jornalista Gaudêncio Torquato, presidente da GT Marketing e Comunicação. Pioneiro da Comunicação Organizacional no Brasil, seu contato com o mercado começou muito cedo, ainda menino na cidade de Luís Gomes, no Rio Grande do Norte, localizada na fronteira com o Ceará e a Paraíba. “Eu era o encarregado de ir até o correio da região buscar uma pilha de exemplares do Jornal do Commercio para o meu pai. Como a única fonte de informação era o jornal vindo do Recife, que chegava em minha cidade em lombo de burro, as notícias estavam sempre atrasadas. Além de buscar, eu também tinha a tarefa de segurar a lamparina ao lado do meu pai para que ele pudesse pôr a leitura em dia após às 20h, quando a energia elétrica era interrompida. Portanto, o meu contato com o Jornal do Commercio se deu bem antes de eu escrever em suas páginas. Entrei no jornalismo por osmose (risos)”, enfatiza. Foi assim que o consagrado profissional tomou um rumo contrário aos sonhos do pai, que ansiava que este entre seus 21 filhos fosse engenheiro.

Seguiu o caminho das letras após os estudos na adolescência em Seminário com padres holandeses, onde teve uma boa cultura humanística, inscrevendo-se em seguida no vestibular da Universidade Católica de Pernambuco para estudar jornalismo, curso instituído em meado dos anos 1960 e que já havia delimitado sua importância na história do ensino de comunicação. “O curso de jornalismo na Unicap foi instituído em 1961, o que lhe conferiu o mérito de ser o primeiro das regiões Norte e Nordeste. Coube ao jornalista Luiz Beltrão, primeiro doutor em comunicação no Brasil com a tese defendida em 1967 na Universidade de Brasília sobre Folkcomunicação, assumir a implantação e coordenação do referido curso. Ao liderar a implantação do curso, Beltrão já somava trinta anos de experiência na imprensa. Nesse tempo, moldou sua opinião favorável à formação superior em jornalismo para quem quisesse exercer a profissão. Em sua visão, os jornais apresentavam deficiências porque trabalhavam com mão-de-obra não qualificada para a função. O curso superior ajudaria a suprir as carências com as quais os jornalistas chegavam às redações”, considera.

Há cinco décadas no mercado, transformação é a visão da trajetória deste conceituado profissional do jornalismo e da comunicação organizacional nesta entrevista exclusiva realizada pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews:

Além de repórter premiado você foi pioneiro nos estudos de comunicação no país. Na sua concepção havia uma lacuna muito grande sobre o que se via nas salas de aula e do que era a realidade da prática, especialmente na questão da comunicação corporativa e institucional que nunca é trabalhado como uma janela da atividade profissional de um jornalista? E nesse sentido o que mudou, em sua opinião?

Gaudêncio Toquarto – Eu não diria que havia uma lacuna, na verdade a comunicação empresarial inexistia na academia.Com a Proal o que fizemos foi aperfeiçoar o que já existia. Na época o jornalismo empresarial era muito bajulativo, voltado só para os dirigentes, feito pelo pessoal de Recursos Humanos, Marketing e Relações Públicas. Observa-se que as organizações que, anteriormente, se recolhiam em uma postura low profile, hoje exercem uma postura high profile por conta da constatação de que as empresas não podem se encolher. Elas devem emergir e aparecer no universo organizacional. As organizações não podem se omitir e deixar de opinar sobre o mundo produtivo, governamental e o universo político. Tenho recomendado às organizações que procurem nos especialistas da área, no comunicador, o aconselhamento para o melhor posicionamento no contexto das organizações na moldura social. Uma lição que ficou das inúmeras experiências que tive como repórter de jornal empresarial é que o veículo tem que ter a cara de quem vai ler. Vejo empresas por aí gastando alguns milhares em projetos gráficos belíssimos e que não têm leitura.

Diante dessa experiência e conhecimento profundo da profissão ao longo de de três décadas. Como analisa a situação do jornalismo hoje, e da própria “indústria” de comunicação, nesta era em que muitos ainda acreditam que a imprensa irá morrer por conta das novas tecnologias?

Gaudêncio Toquarto – Defendo o conceito de que o comunicador na área organizacional não deve ser apenas um operador de meios ou um “fazedor” de tarefas, mas sim um estrategista, elevando-se, portanto, ao topo organizacional no sentido de se transformar em conselheiro dos dirigentes tanto na área pública, quanto na área privada. Não acredito que a imprensa irá morrer pelo simples fato de ser uma atividade intelectual. O que vai e já está acontecendo é a transformação do modo de transmitir a mensagem e também no modo de como ela é captada pelo receptor, de modo mais interativo, rápido. Para praticar um bom jornalismo, hoje, o profissional precisa ter um conhecimento sistêmico e dominar conceitos nas áreas da política, economia, sociologia, história, geografia, antropologia, psicologia.

Ano passado, o senhor lançou o movo livro “Comunicação nas organizações”. O que motivou esse projeto? E quais são os novos instrumentos, programas e formas a serviço da organização que proporcionam maiores resultados no processo de comunicação?

Gaudêncio Toquarto – A comunicação está em constante transformação. O livro tem como proposta demonstrar que a comunicação exerce um extraordinário poder para o equilíbrio, o desenvolvimento e a expansão das organizações. A abordagem sistêmica da comunicação organizacional é um diferencial desta obra. Procuro mostrar que a implantação de sistemas de comunicação nas organizações exige um minucioso planejamento voltado para a multiplicidade dos atos comunicativos, sejam essas empresa públicas ou privadas, entidades governamentais, representativas ou da sociedade civil. Nesse livro, apresento a tese que defendi na Livre-Docência na USP. Ao lado da modelagem de Amitai Etzioni para as Organizações Complexas – o poder remunerativo, o poder normativo, o poder coercitivo, acrescentei o Poder Expressivo.

Apesar da comunicação ser considerada um investimentos indispensável à sobrevivência e ao crescimento das organizações, este é o primeiro corte na redução de custos de uma empresa, especialmente nesse período de crise. Como você analisa este comportamento empresarial, e quais as contribuições diretas da comunicação instituição que a tornam realmente indispensáveis em qualquer situação?

Gaudêncio Toquarto – A comunicação se torna ainda mais importante na crise do que nos momentos de euforia. Principalmente a comunicação interna – com endomarketing forte – para poder sustentar o ânimo da comunidade interna, elevar o engajamento e segurar a participação dos colaboradores na área produtiva. Outra função da comunicação é explicar detalhadamente o que está acontecendo na área social, econômica, política, na gestão, quais áreas estão demitindo, quais estão encaminhando demandas ao governo. Enfim, todos esses elementos integram o escopo do comunicador em tempos de crise. Tradicionalmente é isso o que acontece: “Vamos cortar a comunicação!”. Um erro. Urge reformar a comunicação em épocas de crise, ao invés de demitir. Uma questão que me inquieta há muito tempo é como sensibilizar os dirigentes a entenderem esse escopo? Uma alternativa é convidar um consultor externo, por exemplo, para um workshop no qual os gestores também estejam presentes, para mostrar a importância da comunicação. A partir daí pode ser que haja uma sensibilização maior e compreensão mais adequada do papel do comunicador e, assim, a comunicação será mantida nas organizações sem grandes prejuízos.

Na era digital, todos nós estamos vinculados em alguma rede, mídia ou utilizamos alguma ferramenta social. Qual a melhor forma de profissionais de comunicação e as próprias organizações aproveitarem bem isto no mundo hoje? E como as empresas podem trabalhar isto de forma correta para não só alcançar bons resultados como manter sempre um bom relacionamento com seus públicos?

Gaudêncio Toquarto – As redes sociais representam hoje mais um braço, mais uma teia de veículos de comunicação. As empresas ainda engatinham no assunto, mas algumas delas já entenderam o precioso instrumento de interatividade, fidelização da marca e reforço da imagem que têm nas mãos e começam a se inteirar do tema, assim como os profissionais, sobretudo os mais jovens, que já adentram ao mercado comknow how das ferramentas existentes. É um universo amplo para a comunicação e que precisa ser aproveitado com planejamento específico para o ambiente online.

Fala-se muito da geração Y neste momento, qual a mudança que o comportamento deste publico está promovendo na internet hoje e interfere diretamente no trabalho de comunicação das organizações? E até mesmo dos próprios meios, em seu ponto de vista?

Gaudêncio Toquarto – A geração Y nos traz o conceito do efêmero, do imediatismo, do instantâneo. Os que presenciaram o surgimento da internet, assim como eu, foram obrigados a se adaptar a uma nova forma de comunicar. As notícias “pipocam” o tempo todo e fica cada vez mais difícil assimilar o que de fato é informação. Absorvemos pouco conteúdo hoje em dia. E, em especial no jornalismo, ao meu ver, o grande perigo está na preocupação em “postar antes”. O conceito-base de checar a informação está sendo deixado de lado. Isso não deveria acontecer, pois historicamente o jornalismo tem o compromisso com a verdade.

 
*  Matéria perfil produzida pela jornalista Ivelise Buarque, apresentada no formato original, para a Revista Pronews, edição de Maio/ 2016, número 193

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Ivelise Buarque é jornalista, consultora de comunicação e idealizadora do portal Ivelise Comunica e do Perneando. Com mais de 32 anos de atuação no cenário de comunicação, marketing e negócios, ainda tem grande participação no mercado de comunicação corporativa e marketing de consumo e cultural. E nos dias de hoje atua com foco em cultura, arte, entretenimento e projetos criativos, ajudando marcas e iniciativas a se comunicarem com autenticidade, propósito e impacto.

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