
A pesquisadora Martha Gabriel contou em uma apresentação do TEDx Talks em 2014 uma historinha sobre a lagarta e a borboleta como uma referência sobre criatividade e inovação, enfatizando: “Cada vez que a gente tem um problema novo, a gente tem que ter soluções novas. A gente não pode usar as regras do passado”. Novidades aparecem o tempo todo dentro de um contexto macro, contudo, parece que só se tornam realidade para alguns quando alcançam as telonas ou a grande mídia, como no caso do home Exchange (ou intercâmbio de casas). Este serviço, inclusive, ganhou destaque no filme “O Amor não Tira Férias”, 2006, dirigido pela diretora americana Nancy Meyers, na qual Cameron Diaz (que interpreta a produtora de trailers cinematográficos prática, Amanda Woods) e Kate Winslet (Iris Simpkins, uma jornalista incorrigivelmente apaixonada e fiel à crença no amor) são duas mulheres completamente opostas e residentes em pontos distantes que trocam de endereço e clima durante o período natalino. Esta comédia romântica colocou em evidência a proposta do “exchange” (troca, permuta, intercâmbio), um conceito “aparentemente” novo no mundo. Porém, este é movimento de Marketing Colaborativo, ou Economia Compartilhada, já vem sendo praticado no mercado, no meio online e no comportamento das pessoas ao redor do mundo com a possibilidade de se explorar diversas experiências de aprendizado. “Em uma sociedade globalizada e conectada pela internet, o marketing colaborativo já é uma realidade que tende a crescer e ocupar todas as áreas da economia brasileira. No nosso dia-a-dia faz parte dos nossos relacionamentos e das fundamentais indicações que movimentam o setor de serviços e todas as profissões liberais”, comenta Silvia Celani, diretora da Mafer Comunicação (SP).
A executiva, que é jornalista e mestre em comunicação e mercado, cita a experiência da própria empresa neste processo, a partir de parcerias com clientes que atuam em diferentes setores e que se unem em torno de projetos que trazem benefícios para todos os envolvidos. E não é a toa que esta realidade se estende para vários tipos de setores, como a da moda em que o conceito de “mudar de roupa”, com custos acessíveis, pode ser muito melhor empregado do que adquirir uma nova peça para o guarda roupa, como observado no filme “Sex and The City” em que a assistente Louise (incorporada por Jennifer Hudson) da escritora Carrie Bradshaw (Sarah Jessica Parker) tem a oportunidade de usar bolsas de grife de luxo num sistema de aluguel.
Esses novos desafios estão mobilizando organizações, marcas e comunidades em experiências variadas e que envolvem diversas frentes, basta o consumidor determinar o que deseja e buscar a opção que melhor lhe satisfazer dentro deste imenso oceano de possibilidades. Assim, temos uma variedade de opções que suprem, por um lado, nosso desejo de conteúdo inclusive de produção audiovisual por streaming, por exemplo, como no caso dos populares Netflix, Spotfy, Dezeer. De outro lado, obtemos um amplo acesso à serviços de todos os tipos que nos proporcionam uma diversidade de praticidades, entre as quais a de ir e vir como em sistemas de transporte na qual se destacam Uber, 99Táxis, EasyTaxi, o Carro Leve do Porto Digital e até a escolha do próprio carro por meio do PegCar, plataforma de compartilhamento de veículos particulares que conecta proprietários a condutores interessados.

“A plataforma colaborativa vem para democratizar o acesso a bens e recursos para pessoas que antes não os tinham. Através da colaboração conseguimos diminuir custos, acabar com ruídos na comunicação e ampliar o acesso à informação. Propostas como o Uber dão acesso a mais uma forma de mobilidade para a população, assim como o Bla Bla Car diminui os custos de viagem, ou o Tem Açúcar te dá acesso a bens de consumo sem necessariamente você ter que comprá-los”, lembra Antônio Cardoso, diretor de marketing da Aussi, plataforma que aposta no conhecimento colaborativo para facilitar a vida do empreendedor com a busca de soluções para suas dúvidas de negócio (por exemplo, na área de marketing e vendas, inovação, finanças, planejamento, pessoas, legalização e normas e sustentabilidade). De fato, nada é tão simples, prático e moderno do que transformar o ter em estar. Modernidade esta que nos mostra cada vez mais que você é o que compartilha. além de lançar mão de velhos clichês como “a união faz a força”.
“Estamos passando por um período de grandes mudanças na sociedade por conta da criação e popularização de novas tecnologias. As pessoas estão com smartphones e tablets cada vez mais próximos. Estão cada vez mais conectadas e isso proporciona um meio bastante fértil para iniciativas colaborativas. Assim, os indivíduos deixam de ser agentes passivos que apenas consomem produtos e informações e passam a ser agentes mais ativos, que auxiliam empresas na criação de produtos e serviços (seja com sugestões ou criando diretamente). Produzem um grande volume de informações nas novas mídias, informações essas que muitas vezes são o cerne de negócios”, destaca Felipe Pereira, professor da Faculdade Estácio do Recife (PE). O marketing colaborativo é assim uma nova onda de compartilhamento que cresce no dia a dia das pessoas, no mercado dos negócios e na comunicação, para o especialista, que também é diretor geral do Digaí e da agência digital Unu Soluções (PE).
O professor, escritor e curador do @InovadoresESPM Gil Giardelli já vislumbrava em 2012 esta força de forma enfática, destacando que, na Era do E-agora, o essencial é repensar os modelos vigentes e aproveitar as oportunidades de vida e de trabalho de forma conectada e compartilhada para melhorar o nosso dia a dia e o cenário das cidades. E assim unir forças não só nos torna mais integrados à sociedade como nos abre outras portas e cria novas trilhas. “Embora a adesão ainda não seja tão expressiva, a prática vem apresentando crescimento consistente no País. Cerca de metade da população concorda que a economia colaborativa veio para ficar. Entre os que já tiveram experiências com ela, 44% afirmam que explorarão mais suas possibilidades. Além disso, 53% dos brasileiros que nunca utilizaram produtos ou serviços deste segmento sinalizam grande probabilidade de adesão. No universo de pessoas que já aderiram à prática, 47% foram influenciadas em partes pela crise e 39% foram totalmente estimuladas a fazer proveito por conta das dificuldades impostas pela crise”, diz Karina Milaré (SP), presidente da REDS, empresa da holding HSR Specialist Researchers.

Apesar de parecer um reflexo do momento em que vivemos, este movimento resgata apenas um cenário conhecido por muitos que viveram nos anos 80, se pararmos para analisar. Afinal, quem nunca pegou um livro em uma biblioteca que por sua vez já havia parado nas mãos de outro anônimo? Lembranças à parte, essas “novidades” despontam apenas como a ponta do iceberg deste novo comportamento do consumidor em relação a produtos e serviços, que implica em diversas mudanças no mercado e mexe com a forma de consumo. “O cenário é bastante complexo e multifacetado. Elementos como a aceleração tecnológica, a vida em rede, a concorrência acirrada entre as marcas, a paridade generalizada de produtos e serviços, além dos atuais perfis dos consumidores que têm gradativamente estabelecido para si um novo ethos (hábito), uma nova forma de encarar os desafios de consumo que estão a sua frente (sejam estes de produtos ou serviços, ou mesmo da própria mídia), revelam a impermanência das transformações que assistimos”, comenta a consultora e pesquisadora Karla Patriota, professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), que reforça não poder definir de forma “simplista” o marketing colaborativo.
Para a docente do curso de publicidade e propaganda e líder do Grupo de Pesquisa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) – Publicidade nas Novas Mídias, encaramos uma realidade dividida em dois aspectos que, em certa medida, estimulam a cultura da colaboração. De um lado, contamos com consumidores mais engajados, conhecedores, críticos e sofisticados e, no outro, empresas, marcas e produtos cada vez mais similares, mas lutando por diferenciação. “Parece um contrassenso! Enxergo, justamente, que é nesse espaço que o marketing colaborativo ganha expressividade. Por isso, defendo que a gestão das empresas e marcas deve se pautar na construção de novas abordagens, entendendo que dados estatísticos não são mais suficientes. Na perspectiva ‘colaborativa’ é essencial ‘dialogar’ com o target e, se não o conhecermos profundamente, não conseguiremos. A comunicação da atualidade, os hábitos de consumo de mídia, as influências na aquisição de bens, o ethos de compras, a experiência com as marcas, Tudo está adquirindo um ‘ar extremamente pessoal’, resultante da articulação social, comportamental e psicológica dos novos tempos ‘customizados’”, completa Patriota.
O que eu quero e preciso acaba sendo assim um direito de escolha de ser quem eu sou usando o que eu quero da forma que eu quero, e esta é uma grande força de construção proporcionada pela economia compartilhada. Ela tem ajudado na construção de novas relações com o consumidor que exige outras experiências com as marcas, um branding democrático no qual recentemente apostou a Havaianas, por exemplo. Sempre se reinventando numa estratégia no mercado competitivo, a empresa apostou na nova linha a Alpargatas Havaianas Origine II, pautada na tendência da personalização, para criação de um produto único para o consumidor, que tem o direito de escolher a cor e o tom que deseja em sua sapatilha. “O marketing colaborativo é o presente e o futuro, representa a estratégia do Marketing 3.0, pautada na opinião das pessoas sobre determinada empresa ou produto. Se uma empresa está realmente voltada para o seu público e quer ouvir o que os seus consumidores estão falando sobre ela, o mercado e seus concorrentes, o caminho a seguir é esse. Afinal, o consumidor não tolera mais propagandas invasivas, não é mais facilmente persuadido a adquirir um produto. Inclusive, não acata sem algum tipo de recomendação de alguém próximo ou que influencie em sua opinião, por exemplo, sejam blogueiros, influenciadores digitais, etc”, para a consultora Thailise Monteiro, marketing do Colégio e Curso SEI (www.sistemasei.com.br).
* Parte de Matéria de Capa produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Setembro/ 2016, número 196
