Inegavelmente a atual produção audiovisual é reflexo de um processo de resgate do cinema nacional com Carlota Joaquina – Princesa do Brasil de Carla Camurati, há 20 anos, que trazia uma nova onda no mercado brasileiro recolocando-nos em destaque. Este movimento foi definitivamente iniciado com o aporte de muitas marcas (mesmo que aos trancos e barrancos) e beneficiou, inclusive, outras produções subsequentes como Baile Perfumado (1996), Central do Brasil (1998), Cidade de Deus (2002), Tropa de Elite (2007), Bruna Surfistinha (2011) e mais recentemente o Hoje eu quero voltar sozinho, por exemplo. Até novembro de 2013, este cenário cinematográfico brasileiro registrara a venda de 22 milhões de ingressos para filmes nacionais no mercado interno brasileiros, para projetos como “Meu passado me condena”, apontado como a segunda maior bilheteria do ano. “Nos últimos 20 anos, não havia uma produção constante de filmes de longa, por exemplo, com alto grau de comunicabilidade com o público, ou autorais ou produção de series com produção independente”, lembra Mário Diamante, diretor de projetos audiovisuais do Arte1/ Grupo Band.
Este é apenas um termômetro do momento positivo que estamos vivendo atualmente, estimulado pelo aumento do consumo de produtos audiovisuais (em especial pela indústria cultural dirigida ao lazer), incentivos governamentais, sensibilização de empresas apoiadoras e a cota de emissão de produções nacionais brasileiras em Tvs pagas e o avanço de produções independentes. Isso implica em um mercado de comunicação que sofreu incremento de 8% de 2013 para 2014, só para se ter uma ideia e que ainda promete muito mais. Afinal, assistimos sair dos monitores projetos que alcançaram a telinha e produções que saíram da telinha para as telonas, e vice-versa como Os Normais (2003), E se eu fosse você (2006) e Opaiô (2007). “As coisas aconteceram juntas. Temos uma convergência de fatores positivos. E uma coisa alimenta a outra. Vemos um círculo virtuoso com um aumento de produção para Tv por assinatura por uma nova legislação amparada por investimento público e a ampliação e popularização da Tv por assinatura no brasil. E com isto cresce a força dos independentes que têm uma visão de futuro de exibição e financiamento”, ressalta o diretor de projetos audiovisuais do Arte1/ Grupo Band.
Nos últimos tempos, diversos agentes entraram neste processo preocupados talvez em atender a determinação federal e também de olho no desenvolvimento deste mercado, entre os quais estão bancos de investimento, Fundo Setorial do Audiovisual – FSA, investidores privados. Esses atores se uniram aos tradicionais patrocinadores do setor através de leis de incentivo e ao poder público (MinC, Ancine e a RioFilme, por exemplo) e geraram não só os gatilhos e as condições apropriadas para escoar a produção local no mercado interno como também contribuíram para uma maior estruturação de gestores audiovisuais. “A intervenção do estado foi positiva, mas o ideal é que ela seja menos necessária. Isto é mais saudável para a nossa produção audiovisual, mas ainda não chegou o momento. Contudo, hoje estamos no caminho. Temos que cair cada vez mais no gosto do público brasileiro e ficar cada vez mais independente da politica pública, mesmo que ela tenha sido fundamental”, enfatiza Diamante.

Atualmente, vivenciamos um cenário cada vez mais composto por produtores, diretores e distribuidores e, o mais importante, produções brasileiras que chegam de fato ao espectador e que estão sendo bem recebidas pelo público, ocupando diversos lugares: os monitores, as telinhas de casa, as salas de cinema e os aparelhos mobile (com mais de 210,5 milhões de assinantes de serviço de telefonia no Brasil). Mesmo que boa parte dessa realização audiovisual esteja concentrada em gêneros específicos (como comédias, policiais e biografias musicais), esse conteúdo revela a capacidade de produção e comunicação desta indústria nacional, que trafega mais no segmento da produção independente. “Como nunca houve antes no Brasil uma relação sólida estabelecida entre as TVs e as empresas produtoras de conteúdo, com a obrigatoriedade legal de exibição de produção independente nacional, os canais abriram suas grades para os conteúdos audiovisuais independentes. Isso aqueceu bastante os mercados de produção e licenciamento para as empresas produtoras e distribuidoras de conteúdos, que precisaram se adaptar e ‘correr atrás’ para ‘ocupar’ esse novo espaço, criado a partir da promulgação da ‘Lei do Cabo’”, comenta Samantha Ribeiro de Oliveira.
Os financiamentos, as propostas e os investimentos para as redes de televisão fechadas mostram que este caminho tem dado certo por enquanto, afinal estamos vivendo o fenômeno da popularização das Tvs por assinatura, segundo a coordenadora artística e de conteúdo do canal GNT/Globosat, Patrícia Koslinski, durante debate entre players do setor na segunda edição do Market.Mov (realizado no Recife, em novembro passado), com o incremento da Classe C. Isto realmente motivou este aumento de ofertas e oportunidades para o setor desenvolver produtos audiovisuais de qualidade para televisão e novas mídias de comunicação eletrônica (internet e dispositivos móveis). “De uma forma geral, todos os produtores e distribuidores de conteúdos audiovisuais estão tentando entrar no ‘nicho’ de produção para Tv e Web, mas isso requer um grau de profissionalização empresarial que muitos ainda não alcançaram, tanto do ponto de vista da estrutura técnico-operacional quanto do ponto de vista dos recursos humanos”, diz a gerência de aquisições nacionais da EBC/ TV Brasil.
Mesmo ainda em desenvolvimento de gestão e profissionalização empresarial, essas criações estão crescendo de vento e popa, sendo pensadas de acordo com cada mídia com os apoios públicos e privados necessários, e a garantia de exibição nesses meios. E com isso estão naturalmente ganhando vários adeptos, embasados em casos bem sucedidos no passado como o extinto “Vendemos cadeias” (com o ator Gregório Duvivier do Porta dos Fundos, exibido no Canal Multishow). “Produzir para TV é produzir em escala, com prazos rígidos de entrega e acompanhamento editorial dos canais desde o argumento até o corte final. Isso é totalmente novo na cadeia produtiva do audiovisual brasileiro. Uma produção que está sendo financiada, em sua maior parte, pelas linhas PRODAV do Fundo Setorial do Audiovisual e, em menor parte, por investimentos diretos dos canais”, esclarece Samantha.
* Parte de Matéria de capa sobre produção audiovisual, produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Fevereiro/ 2015, número 178
