As pesquisas para a tecnologia digital começaram na década de 70 no Japão e foi progredindo dos estudos e experimentos iniciais para os formatos que estão sendo implantados no mundo. Um processo que tem caminhado de forma lenta se levarmos em consideração os avanços em outras áreas, além da comunicação. E no Brasil esta transição do sistema de TV analógico para o digital adotou um processo escalonado para que o público seja preparado para a nova forma de ver e encarar tevê, que será de longe parecida com o que já se conhece, quando acontecer o chamado switch off, termo em inglês que representa o desligamento do método tradicional. “Foi criado um modelo específico de tecnologia para TV digital no país, específico para nossa realidade. Para isso, foram realizadas pesquisas nas universidades e discussões com toda a classe. Ou seja, do ponto de vista do conhecimento e do desenvolvimento, nosso país só tem a agradecer ao processo de digitalização. Muitos profissionais foram capacitados e novas vagas e funções estão surgindo, o que também é um fator que coloca a digitalização no patamar de desenvolvimento social”, diz Cleo Nicéas (PE), presidente da Asserpe (Associação das Empresas de Rádio e Televisão de Pernambuco..
Para o executivo, com larga atuação nos meios de comunicação, o novo sistema proporciona diversos benefícios que vão além da questão econômica. Haverá uma melhoria na qualidade do serviço que proporcionará um crescimento do mercado, favorecido pela evolução considerável de áudio e imagem de todos os canais. Mas, em sua opinião, este novo rumo da televisão brasileira abre uma nova janela para outros meios como o rádio, que também será beneficiado com esta mudança. “O espaço deixado pela TV analógica vai abrigar a migração do rádio AM para o FM, abrindo espaço para um outro processo de avanço, que é a digitalização do rádio”, acredita o presidente da Asserpe. Desta forma, temos uma mudança no hábito de ver a tevê, que está entranhada na cultura do brasileiro e interfere no modo de pensar, agir e se relacionar com o mundo. Mas, também temos a possibilidade de maior interatividade e melhoria em outras mídias que ainda se mantêm ativas para a grande massa, e que também serão privilegiadas neste movimento.
E isto justifica todos os impulsos para a implantação do digital, adequação das emissoras e preparação das residências brasileiras para a revolução que lhes aguarda. “Apesar de algumas emissoras terem investido na interatividade em sua programação, por exemplo, com as votações para programas conhecidos como ‘reality shows’, ainda não há interação do público telespectador com os aparelhos de televisão, como previsto no padrão adotado no País. Por outro lado, há poucas ações para incluir a população de mais baixa renda, que estão restritas ao programa Minha Casa Minha Vida do governo federal. Faltam ainda ações que proporcionem acesso nas escolas, principalmente no interior, à televisão digital como meio interativo de educação”, destaca Marcelo Sampaio Alencar (PB), professor titular da UFCG e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Telecomunicações. De fato, para o desligamento do sistema analógico até 2018, foi criada o que a imprensa chama de “Bolsa TV digital” que famílias começaram a ganhar e que envolve um pacote para preparação do sistema. Com a medida, os cadastrados no Bolsa Família devem receber todos os equipamentos (conversor, controle remoto, cabos e antena de recepção) para o sinal digital, que ainda facilitará a própria comunicação entre governo e o cidadão com a estrutura adequada, por exemplo.
Com isso, todos estarão oficialmente aptos para receber o sinal digital das emissoras e se beneficiar com as vantagens que isso proporcionar com as ações tomadas após a realização no dia 30 de setembro de 2014 do leilão da faixa de 700 megahertz em 2014, conforme edital n°2/2014-SOR/SPR/CD-ANATEL publicado pela Agência Nacional de Telecomunicações. A iniciativa gerou a venda de quatro dos seis lotes oferecidos para empresas da faixa de 700 megahertz, uma radiofrequência que possibilitará além de tudo a expansão da internet 4G no país. No final da transição, os canais utilizados na banda de frequência analógica serão devolvidos à União e utilizados na ampliação pelas organizações de telefonia do novo serviço, que hoje só funciona na faixa dos 2,5 Gigahertz no país. Por isso, esta aquisição é essencial para as operadoras Claro, Vivo, TIM e Algar Telecom que saíram vencedoras e que precisam usar essa infraestrutura para comercializar a rede, numa frequência com maior poder de penetração e que acolherá uma conexão superior a do 3G. “A interatividade é um sonho que o Governo ‘comprou’ e não pode entregar por motivos diversos, seja a falta de incentivo das emissoras em trabalhar com o Ginga, de um retorno comercial que pague a conta do desenvolvimento das aplicações, etc. A inclusão digital pode até ser atrelada à interatividade, mas ela é muito mais um fator de entrega da internet para todos do que realmente interatividade para todos. Existem algumas iniciativas isoladas e ‘bem sucedidas’ encabeçadas por emissoras publicas com o BRASIL 4D da EBC. Mas o esforço e a demanda que isso tem empregado, talvez não se sustente comercialmente para as emissoras privadas”, diz Tom Jones Moreira (SP) do Forum SBTVD (Fórum Brasileiro de TV Digital Terrestre).

Para o especialista em sistemas digitais e inovação tecnológica, a digitalização dos serviços de broadcast tem muito mais a oferecer do que jogos e entretenimento dentro da chamada interatividade. Mais do que isso, pode contribuir para diminuir o abismo entre o governo e as pessoas através de serviços como T-GOV (Governo pela TV) e Facilidades de Acesso, que possibilita uma navegação em tevê para diversos usos sem se sair de casa, como realizar marcação de consultas, consultar à FGTS, entre outros. “O Brasil 4D é uma iniciativa neste sentido, mas não podemos negar que hoje temos outros meios como as tevês conectadas (smartvs), e até consolos de vídeo games que podem fazer isso de formas até mais inclusivas. O que falta é uma iniciativa principalmente dos fabricantes em enxergar que os serviços ‘inclusivos’ podem ser bons para os negócios. Se você é uma empresa e cria um aplicativo que se comunica com o INSS, e isso facilita a vida da minha mãe que é aposentada, eu serei eternamente fiel a essa empresa. Afinal ela ‘facilita’ a vida da minha mãe, da minha avó, e que, por tabela, facilita a minha vida também. Até hoje as pessoas não enxergaram isso. Hoje os termos como Gameficação tem tomado os noticiários ditos técnicos, mas acredito que a grande sacada é a acessibilidade do que eu chamo de teleparticipante”, completa Moreira.
O Brasil 4D é um projeto criado e desenvolvido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para oferecer serviços interativos destinado para a população de baixa renda que oferece interatividade e orientação sobre serviços públicos pela televisão, de forma gratuita, através da tecnologia Ginga, desenvolvida inteiramente no Brasil. Apresentado e debatido recentemente no “Seminário Internacional de Comunicação”, realizado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação – Secti, dias 18 e 19 de fevereiro, na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), no Recife, o Ginga é uma ferramenta do Laboratório TeleMídia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), que conectada aos conversores proporcionam o recurso da interatividade. Com a tecla Ginga (Software brasileiro que permite interatividade), abre-se por exemplo uma espécie de aplicativo do Bolsa Família, com as datas de pagamento dos benefícios e as condições de acesso ao programa.
* Parte de Matéria de Capa produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Abril/ 2016, número 192
