Inegavelmente, muita coisa mudou desde os trabalhos dos primeiros pesquisadores que fotografaram o cérebro durante o processo de tomada de decisão. Hoje, é importante ir mais além do que observar quais as regiões do cérebro são responsáveis por determinadas funções (como emoção, racionalidade e memória) e enxergar as funções cerebrais ativadas por determinado estímulo. A tomada de decisão é um fator importante para as marcas, uma vez que o mundo não é mais como 40 anos atrás, em que pesquisas qualitativas, quantitativas e grupos de discussão davam respostas satisfatórias para se descobrir o que o cliente realmente queria. Agora, com os desafios maiores, os riscos são maiores e com isto a necessidade de respostas mais eficazes é fundamental. “Em longo prazo, empresas que se valham constantemente do Neuromarketing terão consigo o conhecimento minucioso das reações neurais que sua comunicação e seus produtos geram sobre o consumidor. Para os negócios, o conhecimento de como ativar o desejo pelo produto ou causar sensações de conforto e deslumbre torna-se uma incrível ferramenta para abordar o consumidor no momento e da forma corretos para ativar o consumo de seu produto ou serviço. Mesmo que pareça estranho conhecer a natureza dos neurotransmissores, a simples descoberta de que o aroma de baunilha incita a produção de serotonina (neurotransmissor que gera sensação de conforto, prazer e bem-estar) foi capaz de dobrar as vendas no departamento feminino de uma grande rede norte-americana – ao borrifar o aroma no departamento feminino, as consumidoras que passassem no local se sentiriam à vontade para comprar mais, sem pressa ou outras preocupações”, reflete Henrique Santos, Planner da agência Rae,MP (SP).
Os aspectos observados nas pesquisas com consumidores (que vão desde as emoções identificadas, reações faciais, movimento dos olhos, batimentos cardíacos e ritmo respiratório) hoje são mais do que relevantes para identificar as características próprias de um grupo. Apesar da globalização, vivemos ainda num mundo onde há culturas, hábitos de consumo e comportamentos diferentes e, em conseqüência disso, mercados distintos como observou pesquisa para a campanha do Whopper do Burger King, realizada em 2008 pela agência Crispin Porter + Bogusky com diversas etnias e países distantes, que identificou que na verdade o sanduíche é um fenômeno americano. A intenção de expor pessoas que nunca experimentaram um hambúrguer na vida daria uma visão de como as pessoas de pontos extremos do mundo se comportariam em relação a um Whopper (da Burguer King) e BigMac (da MacDonald’s), em relação ao sabor, ingredientes e satisfação. Assim como em diversos casos, este projeto apostou em milhões de dólares de investimentos para rodar o mundo e trazer dados favoráveis ao sanduíche criado pelo fundador da marca BK em 1957, em comparação ao introduzido pelo franqueado da marca competidora em 1967 Jim Delligatti. “Muitos profissionais fundamentam suas estratégias de comunicação em experiências de mercados exteriores, esperando sucesso nas ações propostas. Infelizmente, isto ocorre inclusive com o Neuromarketing, ao sugerir aplicações que deram certo em outras culturas. E do reflexo fracasso vem o descrédito com a ferramenta, a exemplo do mercado brasileiro, que ainda apresenta muito receio ao seu uso, ao passo que em outros países o cenário está muito adiantado. Ressaltamos que informar (o quanto antes) acerca de novas técnicas é essencial, justamente para que contradições não ocorram a ponto de gerar a desinformação, comum em relação ao próprio marketing”, destaca Ronan Goerl, sócio-diretor da Cruz & Goerl Consultoria em Marketing (RS).
Naturalmente, as referências ao mercado internacional não são sem propósito. Para se ter uma ideia de como profissionais e marcas se portam lá fora, basta-se observar os investimentos em pesquisas. Somente em 2007, foram gastos 12 bilhões de dólares nos Estados Unidos para desvendar as tomadas de decisões do consumidor, superar a competição e manter-se ativa no mercado num cenário em que surgem 21 marcas novas a cada ano em todo o mundo. Parece que tudo vai bem, mas especialistas apontam que 8 em cada 10 novos produtos morrem em pouco tempo de atuação no mercado, uma comprovação de que as pesquisas qualitativas, quantitativas e grupos de discussão não são mais a chave para descobrir o que o cliente quer. “Os conhecimentos do Neuromarketing possibilitam uma comunicação assertiva, que seja apaixonante à primeira vista e desperte os interesses do consumidor com uma informação. Vai racionalizar o meu desejo de compra numa necessidade. Com tudo que está acontecendo hoje, os recursos e demandas que existem nas agências poderão ter mais possibilidades. Através de todo o seu instrumental e suas técnicas, o Neuromarketing vai fazer com que os investimentos sejam mais eficazes, proporcionar respostas mais profundas desde o caso da embalagem até o aroma de um produto. Os dados são muito mais criveis e verdadeiros do que as que são realizadas em pesquisas tradicionais e em grupos, por exemplo”, ressalta Gilberto Strunck, Diretor de Criação da agência Dia Comunicação (SP).
Mas, é importante destacar que o Neuromarketing não surgiu para substituir o uso dos formatos convencionais de pesquisas ou as teorias já consagradas e comprovadas. Ela veio para complementar os processos de trabalho, reduzindo os desafios das empresas e marcas em tornarem sua imagem e produtos mais relevantes aos consumidores. “Abre portas que antes não se identificavam, investigando os caminhos positivos e os negativos e orientando para mudanças de comportamento. Orienta na análise de branding para sua sobrevivência e ajuda na criação de uma relação emocional com a mensagem que se deseja produzir. O Neuromarketing foi usado, por exemplo, para avaliar a campanha da faixa de pedestre da Prefeitura de São Paulo, que contava com um material bom. Mas, para divulgar a necessidade de comunicação da empresa de trânsito, percebeu-se que algumas imagens desviavam a atenção e que uma determinada foto não destacava o que a mensagem queria dizer. Por isto, ela abre janelas, possibilidades. Mas, não vai substituir os demais tipos de pesquisa existentes e sim complementá-las”, explica Carlos Augusto Costa, coordenador do Laboratório de Neuromarketing da FGV/ São Paulo.
As janelas do Neuromarketing – Enquanto análise científica voltada a um projeto de mercado, o Neuromarketing possibilita diversas análises e subsídios, uma vez que identifica respostas (emocionais e inconscientes) e verifica como o cérebro humano reage à ações e promoções, entre muitas coisas, com uma visão muito além da “psicológica”. “O Neuromarketing tem duas grandes vantagens sobre os modelos tradicionais de marketing: a primeira é na geração de insights sobre comportamento de consumo e de compra. Com o uso de técnicas de pesquisa baseadas na neurociência, é possível reduzir o efeito do observador sobre o objeto do estudo. Ou seja, reduz o risco sempre presente nas pesquisas tradicionais com consumidores em que a pessoa pesquisada fale algo que não reflete o seu comportamento verdadeiro – isso pode acontecer se a pessoa mentir ou simplesmente não tiver consciência do que faz. A segunda é na criação, do design ao messaging e a decisão dos meios e pontos de contato com a audiência e, em especial, com os shoppers – no momento da compra. Nesse ponto, utiliza-se de conhecimentos da neurolinguística e até da hipnose para impactar os consumidores e shoppers em vários níveis conscientes e inconscientes, racionais e emocionais, tocando fundo em crenças, valores e na própria noção de identidade pessoal associada à identidade da marca”, comenta Rafael D’Andrea, diretor da Agência Shopper (SP).
Isto é importante já que estudos revelam que é preciso menos de dois segundos e meio para que um consumidor tome a decisão de comprar e, por isto, as empresas têm uma fração de tempo para atrair seus olhos, capturá-lo e torná-lo um cliente, especialmente no momento da compra. E aí a conexão com o produto se faz mais do que importante e transforma esta numa nova abordagem para a inteligência de mercado, já usada por 65% das 500 marcas da Fortune. “O Neuromarketing realmente oferece novos campos e novas formas de pesquisa com suporte científico, baseada em aspectos não verbalizados como as demais. Quando você cobre esta percepção, pré-testa reações e comportamentos e se aprofunda melhor, reduz muito mais as taxas de erro. Dessa forma, ele se aplica para vários tipos de trabalhos e de campanhas, porque integra ferramentas do planejamento científico e métodos que vão determinar as melhores estratégias”, coloca Marcela Montenegro, Diretora Executiva do IPESPE (PE), empresa que acaba de anunciar a implantação do seu NeuroLab, projeto em desenvolvimento desde 2010 com a Dra. Silvia Laurentino (especialista em neurociência do comportamento), que conta com uma equipe que realizou viagens à Europa e EUA.
A efetividade das ações estratégicas e o retorno dos investimentos nas ações de comunicação é definitivamente uma das grandes promessas deste diálogo entre a neurociência e as pesquisas tradicionais. Apesar de já ter assumido, nos últimos anos, importância estratégica em organizações do mundo inteiro, chega ainda ao Brasil com algumas considerações, já que até o momento foi usada em ações específicas de marcas de grande porte como a como Johnson, MTV, Proctor-Gamble, Unilever e Coca-cola. E como uma coisa muito nova, o Neuromarketing ainda é uma disciplina realmente, pouco conhecida e, por isto, é importante se investir no conhecimento das suas possibilidades e potenciais, nesse momento. Isto porque são poucos que entendem que o seu uso pode ir além do reforço junto aos shoppers das marcas, ou a absorção da mensagem correta pelo público. “Como um simplificador, o Neuromarkerting possibilita compreender o universo das pessoas de forma mais ampla, a mente humana. Sendo assim, é possível entender porque colaboradores reagem de forma tão diferente ao mesmo estímulo, ou as mesmas recompensas. E também como desenvolvem velocidade e modelos de aprendizado diferentes. Tudo isto pode ser entregue pelo Neuromarketing, como uma forma de avaliar e estudar melhor os nossos pontos de deficiência. Desta forma, pode ser um novo degrau da nossa escala de relacionamento das organizações com as pessoas. E se você pensar em poder eliminar com total segurança e tranqüilidade todos os controles e obrigações que praticamos entre empresas e colaboradores, uma vez que 30% a 40% do tempo dos gerentes está voltado a cumprir tarefas não produtivas de controle, pode-se transformar este em tempo de produtividade imensurável”, ressalta Luis Perdomo, administrador de empresas e especialista em Gestão Estratégica e Marketing.
Como todas as novas tecnologias que estão sendo desenvolvidas, uma empresa que pretende se manter sempre no limiar e apostar em inovação precisa de uma ferramenta como esta, que lhe possibilite interpretar o pensamento e identificar respostas emocionais e inconscientes. Contudo, é importante lembrar que, por mais extraordinário que seja este admirável e novo mundo apresentado pelo Neuromarketing, ele não é um “buy button” e assim como tantas oportunidades seu futuro não está totalmente traçado.
* Continuação de matéria produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Fevereiro/ 2012, número 143.
