Quando não basta apenas ter uma ideia na cabeça, plataformas colaborativas ajudam a concretizar ideias e projetos. E isso é Crowdfunding. “O crowdfunding surgiu em 2006 e era voltado apenas para iniciativas musicais com o site europeu ‘Sellaband’. Rapidamente outros lugares do mundo começaram a utilizar a ferramenta de captação de pequenos valores pela multidão em outras áreas: politica, cultura e outros”, lembra Dora Dimenstein do Nosacuda Ideias Criativas (www.nosacuda.com.br), primeiro site de crowdfunding de Pernambuco. Segundo a especialista, este movimento começou no Brasil em 2009 com o site Vaquinha e em 2011 com o Cartarse, que se tronou o modelo de impacto por se focar em projetos de natureza cultural em geral.
“O crowdfunding é um fenômeno virtual que otimiza usuários da web na captação de recursos, de forma colaborativa, para projetos de produção independente que podem ser de natureza pessoal, social e cultural disseminando a Economia Criativa como o processo meio e como ferramenta de transformação. Ele foi motivado pela democratização digital, a otimização de ferramentas tecnológicas e de redes sociais”, define Dora. Contudo, é importante se observar determinadas ressalvas. “Apenas colocar o projeto na plataforma não garante sua realização, o proponente precisa ter uma rede forte e ampla nas mídias sociais para obter apoio de muitas pessoas que irão contribuir com pequenas quantias; estipular recompensas criativas e interativas que motive as doações”, diz Dora, que alerta para alguns erros frequentemente cometidos.
No Nosacuda, tenta gerar oportunidades para o desenvolvimento de projeto com proposta diferenciada, utilizando a plataforma do crowdfunding com curadoria de visão multi-plural para eliminar os projetos sem propósitos e sem consistência. “Muitos sites de crowdfunding vêm aumentando a cada dia para atender a diferentes e específicos nichos. Entretanto muitos não conseguem se estabelecer. Acreditamos que uma das principais causas é a falta de conteúdo, estudos e pesquisas na área para nortear e dar suporte técnico, operacional e de negócio para as Star Ups que surgem à todo momento”, comenta ela, que declara que uma das formas de se diferenciar é apostar num formato com diferenciais específicos: Nosacuda resgate (prorrogação de 60 dias do prazo de encerramento da captação); Desata-nós (doações de pequenos valores para interessados na realização do projeto); e Recompensas (orientação sobre criação de estímulos à doação colaborativa e interativa).

Pensar amplo é essencial, assim como buscar entender primeiro como funciona e a forma ideal de se usar o financiamento coletivo em benefício do projeto. Até mesmo porque a premissa parece muito fácil, mas como são várias plataformas em atuação hoje, cada uma mantém sua própria política, mesmo com algumas similaridades. “Os autores de projetos não precisam mais depender de editais do governo ou patrocínios de empresas. Agora, a ‘multidão’ pode fazer um projeto acontecer. Mas, há casos de insucesso, sim. Os motivos são variados, as pessoas precisam estudar os casos de sucesso e entender como o mecanismo funciona antes de iniciar sua campanha. Há um curso de crowdfunding na Diálogo Social (http://www.dialogosocial.com.br) para quem se interessar”, comenta André Gabriel (MG), criador do Mobilize (http://www.mobilizefb.com/).
Para ele, que coordena esta que é a primeira e única plataforma dentro do Facebook, todos podem se beneficiar do financiamento coletivo pelo fato de ser uma forma independente, contudo, a ideia é apenas o primeiro passo, para o sucesso no crowdfunding. Antes disto o idealizador do projeto deve saber construir e divulgar sua campanha, e naturalmente, no caso do Mobilize, a mídia social particularmente. “A divulgação ocorre entre redes de amigos online. O Facebook é a maior rede de amigos online no mundo e no Brasil onde conta com 72 milhões de usuários. O Mobilize foi criado para aproveitar esta força para financiar projetos coletivamente. Na prática, o autor do projeto entra no site www.mobilizefb.com, instala o Mobilize em uma fan page e começa a receber contribuições diretamente dentro do Facebook”, destaca André.

Como criador, ele se orgulha do fato de todos podem se beneficiar das vantagens da plataforma e da praticidade para que qualquer pessoa possa usá-la, uma vez que o Mobilize é livre. “Mil e duzentas pessoas já instalaram o Mobilize em fanpages. Um caso de sucesso é o projeto Malucos de Estrada (http://www.mobilizefb.com/malucosdeestrada), que arrecadou R$ 50.000 de 1.500 pessoas. O que leva um projeto ao sucesso é: 1) causa de interesse coletivo; 2) vídeo bem elaborado; 3) recompensas atrativas e 4) divulgação assertiva e contínua durante todo o prazo da campanha”, pontua ele.
Foi com o objetivo de participar desse movimento novo e ajudar pequenos empreendedores e artistas a tirarem suas ideias do papel que nasceu também o Startando. “O crowdfunding proporciona aos amigos, fãs e qualquer pessoa que se identifique com a proposta, consiga apoiar diretamente, sem intermédio de agentes ou instituições financeiras. E é essa a real diferença do financiamento coletivo: ele transforma essa relação entre artista e público em um processo transparente, direto e sincero”, diz Caio Ciampolini (SP), sócio-diretor do Startando (https://www.startando.com.br/), que acredita que esse conceito veio pra ficar e não se trata de uma moda passageira.
A iniciativa representa união de profissionais de formações distintas visando criar uma comunidade capaz de dar vida a boas ideias. “Beneficiamos a todos os empreendedores com relação à possibilidade da execução, em qualquer tipo de proposta, sejam elas de negócios, entretenimento, cultura, design, aplicativos ou qualquer ideia criativa que tenha relevância. As plataformas tem uma média de 50% a 60% por cento de projetos bem-sucedidos e nossa meta é ter um índice acima de 60%. Por isso, fazemos uma seleção criteriosa e ajudamos em todo o processo de divulgação”, comenta Ciampolini.
Para ele, são vários os motivos de um projeto não obter sucesso que incluem desde planejamento adequado até mesmo de network. Afinal, a proposta deste modelo se baseia na conquista de “anjos” que se identifiquem e comprem a ideia. “Tivemos dois projetos que não arrecadaram o valor necessário para sua concepção. E observamos que um projeto geralmente não atinge sua meta quando o criador imagina ter um poder de divulgação maior do que realmente tem. Nesse caso, a meta financeira fica muito alta em relação à rede de contatos do criador. É preciso tomar cuidado com essa equação. Nós sempre fazemos o processo de curadoria do projeto, mas é importante que haja um planejamento adequado por parte do criador”, destaca Caio que aponta como principais diferenciais do Startando a plataforma (um site melhor organizado, intuitivo e com mais funcionalidades e design), a seleção (uma curadoria ativa com um processo mais rígido de seleção) e a visão (inclusive, auxiliando com a arrecadação financeira e prestando todo o suporte necessário para dar vida às boas ideias).
Atuando só há cinco meses, o Startando já tem mais de 200 propostas inscritas e três projetos bem-sucedidos: Holi Festival das Cores (milenar evento indiano que tem o intuito de celebrar a chegada da primavera), o Parlamento de Corujas contra Fome e o Mais tênis, mais vitórias. Eles superaram em mais de 100% a meta de arrecadação com propostas focadas em impactar terceiros com celebração a vida através de ações culturais e sociais. Mas, ainda conta com outros dois projetos no ar em fase de arrecadação (até o fechamento desta edição, com cerca de 50% do financiamento adquirido). “Acho que o crowdfunding pode revolucionar o mercado cultural e de pequenos empreendedores sim, exatamente pelo Startando unir artistas e empreendedores com o público e seus entusiastas. Essa é a expectativa!”, enfatiza Ciampolini.

Naturalmente, o consenso entre muitos que estão envolvidos neste novo cenário é a de que o crowdfunding é muito mais que uma febre, afinal, é uma excelente forma de mobilizar recursos para projetos de impacto. Mas, ainda há muito a se analisar em relação uma vez que este se tratar de um mecanismo muito novo. “Crowdfunding muda a relação sobre como as pessoas se engajam na produção e consumo de produtos e serviços na sociedade, deixando tudo mais democrático e horizontal. E por isto é preciso ter em mente que a campanha exige muito esforço. Não é apenas subir a campanha no ar e esperar que as pessoas irão chegar até o site, isso não existe. É preciso se empenhar em divulgar de forma criativa e para o público de interesse do seu projeto”, lembra Dorly Neto (RJ) do Benfeitoria.
A iniciativa, que começou como uma startup em 2011, nasceu motivada pela vontade de reduzir as barreiras de engajamento para as pessoas que desejam fazer parte do processo de transformação, mas que não sabem como fazê-lo. “Na Benfeitoria, qualquer pessoa com um projeto de impacto positivo pode tentar conseguir recursos de forma coletiva. A pessoa apenas precisa mobilizar suas redes para conseguir colaboradores e oferecer recompensas em troca. E, com isto, já se foram mais de 100 projetos viabilizados, que totalizaram em torno de um milhão e trezentos mil reais”, diz Neto.
O criador do Benfeitoria ressalta que realmente não há uma fórmula para o projeto ter sucesso. “Antes de um projeto subir na plataforma, avaliamos junto com o idealizador o potencial de arrecadação do projeto”, diz ele que não acredita que o crowdfunding veio para revolucionar o mercado por ser um fenômeno muito recente e ainda estar limitado às camadas dominantes da sociedade. “Mas, vai contribuir para a democratização desses meios, com o tempo, nós acreditamos nisto”, comenta.
O mais antigo em atuação, desde 2011, o Catarse tem mostrado cada vez mais que este é um modelo que vem para ficar. Afinal, por ele já passaram 1.462 projetos, dos quais 810 (55%) alcançaram a meta de arrecadação, num total de mais de 102 mil pessoas que contribuíram com cerca de R$ 12,5 milhões para essas iniciativas. E hoje há ainda 122 projetos no ar neste momento. “O financiamento coletivo vai revolucionar não só os mercados de produção cultural e de comunicação independente, mas de diversas cadeias produtivas, como empreendedorismo, ciências, jornalismo, tecnologia, design, games, ativismo etc. É um caminho sem volta de mais independência, contato, proximidade, honestidade, transparência e agilidade em diversas cadeias produtivas”, diz Felipe Caruso (RJ), um dos criadores e coordenador de comunicação.
Segundo um dos sócios diretores do Catarse, todo projeto tem que ter começo, meio e fim bem definidos. Deve atender todos os itens obrigatórios que incluem vídeo de campanha, recompensas para os apoiadores, descrição transparente e uma meta financeira realista para um prazo entre um e 60 dias para a captação. “O sucesso depende do seu planejamento para encontrar essas pessoas, contar bem a sua história, mostrar a importância da ideia e engajar apoiadores na campanha. É um grande jogo de mobilização de redes e que precisa ser muito bem pensado. Em média, 55% dos projetos alcançam a meta de arrecadação. Em compensação, 85% do dinheiro que entra no Catarse vai para os projetos bem-sucedidos”, diz.
Assim como a proposta do financiamento coletivo, o Catarse se desenvolveu coletivamente com a integração das propostas de três grupos que estavam desenvolvendo as suas plataformas. E, de forma coletiva, tenta proporcionar uma experiência útil, ágil e em constante evolução para quem apostar nele. “O realizador tem que estar ciente que ele é o único responsável pela divulgação da campanha e pela mobilização de pessoas. É muito importante para o sucesso do projeto que ele tenha um plano de ação. Nosso processo de seleção é bem simples, na verdade apenas recusamos projetos que realmente não entendem a proposta da plataforma ou que evidenciem despreparo para encarar essa maratona. De maneira alguma nossa equipe julga a qualidade artística dos projetos até porque não somos qualificados para tal, nem é esse o papel do Catarse. Quem decide se um projeto vale a pena ou não, em última instância, é a comunidade que vai apoiá-lo ou não”, enfatiza.
* Parte de matéria de capa sobre Crowdfunding, produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Janeiro/ 2014, número 165.
