 Como se diz “em terra de cego, quem tem um olho é rei”. E o Brasil reina absoluto como o primeiro no mundo em toda a história da tecnologia a criar uma ferramenta legislativa para regular o meio. Com cinco anos de atraso, lógico, mas começamos um momento histórico com a aprovação inicial do projeto de lei na Câmara dos Deputados, no dia 25 de março, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet. Sob o número PL 5403/2001, o texto intitulado Marco Civil da Internet (http://marcocivil.org.br) propõe uma série de determinações em defesa da privacidade de todos que utilizam a Internet, e das obrigações do governo e empresas, assim como e observações sobre os limites dos usuários para garantir o uso adequado da rede. “A era romântica da Internet acabou. Hoje estamos falando de um canal de informações que movimenta bilhões de dólares e se integra cada vez mais com todas as outras Mídias. Num primeiro momento qualquer regulamentação causa certo receio, visto que até agora o modelo de funcionamento era regulado pelo próprio mercado. Porém vivemos hoje problemas reais como invasão de privacidade, roubo de dados e questão da liberdade dos usuários”, diz Christopher Montenegro, diretor geral da Malagueta PDV (RJ).
Como se diz “em terra de cego, quem tem um olho é rei”. E o Brasil reina absoluto como o primeiro no mundo em toda a história da tecnologia a criar uma ferramenta legislativa para regular o meio. Com cinco anos de atraso, lógico, mas começamos um momento histórico com a aprovação inicial do projeto de lei na Câmara dos Deputados, no dia 25 de março, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet. Sob o número PL 5403/2001, o texto intitulado Marco Civil da Internet (http://marcocivil.org.br) propõe uma série de determinações em defesa da privacidade de todos que utilizam a Internet, e das obrigações do governo e empresas, assim como e observações sobre os limites dos usuários para garantir o uso adequado da rede. “A era romântica da Internet acabou. Hoje estamos falando de um canal de informações que movimenta bilhões de dólares e se integra cada vez mais com todas as outras Mídias. Num primeiro momento qualquer regulamentação causa certo receio, visto que até agora o modelo de funcionamento era regulado pelo próprio mercado. Porém vivemos hoje problemas reais como invasão de privacidade, roubo de dados e questão da liberdade dos usuários”, diz Christopher Montenegro, diretor geral da Malagueta PDV (RJ).

Isto não é a toa. Escândalos e vazamentos de informações e fotografias, exploração de imagens de terceiros, engodo de tráfego de dados são alguns dos graves problemas relacionados ao meio online. Casos como o do vazamento de fotos nuas da atriz Carolina Dieckmann, em maio de 2012, reforçou a importância de diretrizes nesta terra de ninguém. Mas, e agora? Como ficamos? Será que não corre o risco de ficar “tudo como d’antes na terra de abrantes”? Afinal, convenientemente, a proposta ocorre em um ano bastante interessante ao país: Copa do Mundo e Eleições Presidenciais. “Com a aproximação da Copa do Mundo, a possibilidade de sanção do Marco Civil da Internet e eleições políticas, muitos estão apreensivos e ansiosos, buscando compreender os efeitos causados por estes acontecimentos, no decorrer de 2014 e em 2015. O Marco Civil ainda desperta dúvidas em muitas pessoas sobre o que realmente isso significa e no que resultará”, comenta Bruno César Abussamra, analista de mídias sociais da Rae,MP (SP).
Fato! Estamos trafegando por um mundo totalmente novo, mas que trará muita coisa positiva segundo alguns especialistas. “O projeto é bom, acho que está entre as legislações mais avançadas do mundo no tocante à garantia da liberdade na rede”, afirma o especialista em marketing digital Gabriel Rossi (SP). Para ele, a aprovação do Marco Civil da Internet chega em momento de uma série de questões referentes ao uso “inadequado” da internet, hoje objeto de discussão e mesmo de ações judiciais. “Com regras claras, o tratamento dado à internet irá mudar. Internet não é jornal, revista, televisão, embora às vezes se comporte como um desses veículos. Então o seu diferencial tem que ser levado em conta. Penso que, com o Marco Civil, decisões judiciais – como determinar que uma rede social passasse a monitorar certo usuário; ou decidir que o Comitê Gestor da Internet tire sites do ar, como se o Comitê respondesse pelo que sites exibem – poderão ser evitadas”, diz Rossi, que acredita que a neutralidade da rede é um grande destaque na nova legislação, por exemplo.
No país das penas curtas e da grande liberdade de expressão em rede, uma legislação própria vem até a calhar. Contudo, o grande embate nisso tudo é até que ponto vai ajudar ou prejudicar o brasileiro. Afinal, estamos falando de uma mudança necessária mas para a qual não estamos todos preparados. “O Marco Civil estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria. E entre os principais pontos do projeto estão a garantia do direito à privacidade dos usuários, especialmente à inviolabilidade e ao sigilo de suas comunicações na rede mundial de computadores. Atualmente, as informações são usadas livremente por empresas que podem comercializar esses dados para setores de marketing ou vendas”, segundo Celso Oliveira da Oliveira Augusto Maaze Advogados (PE).

Chovendo no Chip – Favorável a alguns pareceres do texto, ele vê que alguns dos princípios são importantes e asseguram o usuário de abusos, assim como outros colocam em questão os cuidados que devem ter as prestadoras de serviços. “O assunto é importante, na medida em que há decisões judiciais condenando os provedores por seu conteúdo, publicado pelos usuários da rede, por ação ou omissão. Com efeito, os provedores de conteúdo (ou de aplicações) alegam que não dispõem de meios técnicos e humanos para fiscalizar previamente todo o ambiente virtual. Um artigo publicado na Revista de Direito Administrativo argumenta que as regras do Marco Civil estabelecem um regime de proteção sem razoabilidade, no qual a liberdade de expressão recebe proteção superior àquela garantida aos direitos da personalidade”, comenta Oliveira.
Este é apenas um problema num mundo onde ser it é ter fotos de selfies, de todos os tipos, espalhadas todos os dias nas redes sociais, e em que as definições que dizem respeitos a muitos acabam sendo decretadas por alguns? Na verdade, não! O projeto foi baseado em alguns estudos minuciosos para fazer valer com rigor o que acredita ser correto para o bem estar do cidadão. “De modo geral o Marco Civil é um avanço. A grande controvérsia é que, sendo sua proposta de elaboração coletiva e aberta, o Marco Civil não foi concebido como resultado de um consenso pacífico, mas como o produto de uma opção política, ainda que baseada na diversidade de interesses de uma sociedade plural”, destaca Celso.
São vários os lados da moeda. Em parte, demonstra uma fraqueza do sistema como um todo, especialmente no que diz respeito ao controle do uso pessoal e à regulação das operadoras e normatização do setor. Mas, por outro, dá o pontapé inicial numa necessidade antiga. “É bom lembrar que essa discussão levou três anos e envolveu dezenas de entidades de classe, políticos e especialistas na área. O Brasil será um dos poucos países do mundo a estabelecer a neutralidade da rede como regra. Como consumidores até então tínhamos os nossos direitos desrespeitados por mau funcionamento da rede, lentidão de tráfego, etc”, lembra Christopher Montenegro da da Malagueta PDV.
O que será da rede de internet nacional agora com uma legislação própria? Realmente, a lei permite agora a responsabilização das empresas de diversas formas, e este talvez seja só o primeiro passo para uma série de ações para organização da cassa. “Aos usuários fica garantida toda a privacidade de suas comunicações pessoais, a efetiva prestação dos serviços dentro do que foi contratado, como conexão e velocidade, a aplicação das normas de defesa do consumidor para a defesa dos seus interesses e o direito a ser indenizado por danos de natureza material ou moral em caso de descumprimento do quanto determinado pela Lei”, pontua a advogada Flávia Presgrave da Martorelli Advogados (PE). Com isto, qualquer pessoa passa a ter direito de ser indenizado por danos de natureza moral e material pela indevida divulgação de conteúdo ilícito, não autorizado e que tenha conteúdo de natureza pessoal, desde que tenha interferência negativa em sua vida pessoal e social, segundo ela.
“Os provedores passam a ter a obrigação do correto e regular armazenamento das suas informações, com todas as medidas de segurança e sigilo que garantam a confidencialidade das informações ali disponíveis, passíveis, em caso de descumprimento, a sanções de natureza administrativa, independente das demais, tais como advertência, multa, suspensão temporária da atividade ou a proibição do exercício da atividade”, ressalta Presgrave. E, desta forma, ela frisa que as empresas terão que prezar pelo controle das informações e pelo funcionamento dos fluxos, velocidade, conexão e gerenciamento de dados para garantir sua inviolabilidade.

Uma vez que os provedores tem a obrigação de proteger a privacidade dos clientes e usuários, impedidas de liberar informações de conteúdo e dados pessoais, também não podem ser responsabilizadas pelo uso indevido do sistema. Ou seja, não podem responder judicialmente por conteúdo gerado e disponibilizado por terceiros, salvo notificação previa. Neste caso, quem responde pela utilização inadequada destes conteúdos são os próprios infratores. E aí entra toda uma questão que se deve pensar: a segurança. Afinal, há a ação real e os inadvertidos vazamentos de diversos conteúdos nuvem afora.
Enquanto no resto do mundo existe já o ataque contra problemas muito corriqueiros (pedofilia, direitos autorais, abusos à privacidade e outros temas), aqui estamos apenas começando esta luta. “Hoje a Internet tem um tratamento absolutamente diferente do que é praticado no mundo real e a regulamentação do todo é o principal avanço com o projeto. Acredito que ele é um (grande) primeiro passo e que poderá impulsionar algo maior. Para termos uma ideia da falta de regulamentação adequada, hoje tratamos o sigilo telefônico como um direito fundamental à intimidade, mas os registros que dizem todos os sites e acessos realizados pelos internautas não contam com a mesma garantia. O ponto controverso é o equilíbrio entre segurança e privacidade”, comenta Rogério Reis, diretor de Operações da Arcon Serviços Gerenciados de Segurança (SP).
FOTO 3 – Rogério Reis, vice presidente da Arcon III
O acesso à internet no Brasil é realmente muito precário, e as reclamações contra operadoras provam isto, especialmente no que diz respeito àquelas que pregam uma coisa e cumprem outra. O velho gato por lebre bem brasileirinho que nós conhecemos e que assola o país no que diz respeito à inovação tecnológica. “O Marco Civil é um misto de garantia de liberdade de expressão e proteção de dados, com controle governamental, à medida que submete as empresas e provedores à leis mais severas sobre conteúdo, onde pode-se instaurar uma censura legalizada. Mas, sem uma legislação, mesmo que com uma ideia inicial, fica muito complicado o usuário se defender de abusos. Quem trabalha no mercado desde os anos 90, por exemplo, sabe dos abusos que as algumas empresas provedoras de acesso são capazes. É necessária uma legislação, porém, pode evoluir bastante do modelo proposto atualmente”, comenta José Jarbas, CEO da eCRM 123 (SP).
Segundo ele, isto nos dá um norte no que diz respeito à atuação das principais afetadas, a empresas de internet (como ISPs e desenvolvedoras de softwares), como acontece em todo processo inicial. Enfim, não existem leis perfeitas e não existe ordem sem leis, principalmente no Brasil. Mas, restam agora as demais partes se adaptarem à nova ordem legal, como as startups, por exemplo, que estão envolvidas no processo de inovação tecnológica. E quanto a nós, meros usuários, devemos ter cautela e o necessário bom senso em todos os sentidos. E no resto, torcer para que este seja realmente o avanço que queremos para mudanças positivas para todos, como é da opinião a gestora de conteúdo da MV2 Digital (PE), Carol Barbosa: “É conhecido o medo que se tem do novo. E, com o Marco Civil da Internet, como tudo que venha a impactar em diversas esferas da sociedade, não seria diferente. O consumidor estará, de certa forma, mais seguro e as empresas provedoras de acesso à rede terão mais responsabilidades. Mas, à minha ótica, o Marco teria que ser antes de tudo um reflexo da atualização do nosso Código Civil. É como falamos em comunicação: ter-se uma linguagem integrada para que as soluções para a sociedade sejam pensadas de forma unificada. Esse acontecimento não deixa de ser um passo para a nossa reflexão, mas está distante de ser o ideal”.
* Matéria sobre Marco Civil, produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Abril/ 2014, número 168.

 
		
