Há milhares de séculos, Jesus Cristo dava o pontapé inicial num conceito que hoje se torna mais realidade do que nunca, mas no campo dos negócios: partilhar e dividir. No mundo em que compartilhar é melhor do que trabalhar segregado, temos uma nova realidade e uma nova forma comercial de concretizar ideias e de promover inovação, que depende essencialmente do interesse do próximo. Isto é crowdfunding, um termo inglês cuja criação é creditada ao empresário americano Michael Sullivan, em 2006. “Existem várias palavras em inglês, e diversas traduções para o português. (E eu faço traduções do alemão por português), mas a melhor versão para nossa realidade é: vaquinha via redes sociais (no meio cultural), ou ‘assinatura no livro de ouro’ (em ambiente esportivo, escolar e religioso)”, diz o escritor, consultor em recursos humanos e designer, Igor Rafailov (PE), autor de Dicionários de Fobias.
Palavras fortes do engenheiro eletricista Nolan Bushnell, empreendedor e criador da Atari, expressa bem a força motriz deste novo movimento: “o ingrediente básico é mover a bunda e começar a agir. É tão simples como isso. Muitas pessoas têm ideias, mas poucos optam por fazer algo sobre isso hoje. Não amanhã. Não na próxima semana. Hoje. O verdadeiro empreendedor não é um sonhador, é um fazedor”. E, com o crowdfunding, ou seja, o financiamento coletivo, isto é possível. Afinal, este formato de custear um projeto não envolve as exigências e barreiras das formas tradicionais do sistema bancário e de crédito facilitados que existem.
Ele nasceu da necessidade e da disposição de terceiros apostarem, sem compromissos financeiros concretos na realização de propostas, que não conquistaram apoio entre grandes indústrias de diversas áreas. E alcançou o mundo como uma brilhante ideia e chegou ao Brasil como uma tábua de salvação. Dados do relatório da Massolution, empresa de pesquisa, de consultoria e implementação americana, apontam que os projetos de crowdfunding conseguiram cativar 2,7 mil milhões de dólares em investimento, que serviram para apoiar mais de um milhão de campanhas em 2012. Esta soma é impressionante e mostra que o financiamento colaborativo cresceu 81%, em relação ao ano anterior.
Este novo conceito de vaquinha possibilita que uma ideia saia da cabeça e se concretize, quando antes morria muitas vezes por falta de financiamentos. Esta nova plataforma colaborativa possibilita hoje que muitos realizem projetos de forma, aparentemente, muito simples. E recebe cada vez mais adeptos no país e no mundo, onde a iniciativa ganha mais espaço pegando carona em exemplos de investidas estrangeiras. “O crowdfunding está crescendo por todo o mundo. No Brasil, não é diferente”, destaca André Gabriel, criador do Mobilize (MG).

Fato. Ao longo deste passado, diversos nomes de projeção apostaram nesta nova forma de financiamento para publicar livros, lançar Cds e Dvd´s e promover diversos projetos para o grande público. Recentemente, Spike Lee apelou ao crowdfunding para conseguir US$ 1,25 milhões para completar o orçamento para o seu próximo filme nos Estados Unidos, e em três dias o projeto já atraiu 930 investidores, totalizando US$ 130 mil. “O financiamento coletivo ocupou enorme falha dos sistemas tradicionais de financiamentos culturais, científicos, empreendedores etc. Uma grande demanda reprimida por falta de financiamento encontra menos burocracia, risco quase zero, mais agilidade e independência do financiador, além de um potencial de financiamento ilimitado”, comenta Felipe Caruso (RJ), coordenador de comunicação do Catarse, um dos primeiros sites de financiamento coletivo no país.
Foram estas possibilidades que deu força ao crowdfunding. E foi por isto que o Sepultura apostou na plataforma via o Kickstarter, em abril, para arrecadar US$ 1 milhão (cerca de R$ 2 milhões) para cobrir todos os custos de produção e transformar o filme em formato 3D. E em agosto, a Banda Raimundos fez uso de campanha no Catarse para arrecadar verba para um novo Cd “Batizado de Cantigas de Roda” e o resultado disto foi a conquista de R$ 123.278,00 o dobro do pedido inicial de R$ 55 mil reais. “Para o realizador do projeto, o principal benefício é ter mais independência para fazer o seu trabalho, além de um contato direto com as pessoas interessadas na realização dele. Para o apoiador, é o sentimento de ser parte de um projeto maior, de algo ele acredita, de compartilhar do sonho de uma pessoa”, reforça Caruso.
No primeiro semestre de 2013 foram arrecadados cerca de R$ 7 milhões dos 64 mil apoiadores para 620 projetos, de acordo com dados do Catarse – um dos primeiros sites de financiamento coletivo no país. Contudo, pode parecer um meio mais fácil de viabilizar uma boa ideia, mas, assim como qualquer outra forma de se conseguir dinheiro, esta é uma ferramenta ainda trabalhosa. “Crowdfunding não é só uma questão de uma boa ideia. Inclusive porque nenhuma boa ideia, sem um planejamento adequado e cuidadoso, sem gestores comprometidos vai para frente. Os projetos em crowndfunfing precisam ter ‘relevância’, ser aceitos socialmente, ter reconhecimento real, ser capaz de envolver as pessoas para colaborar. Se não brilhar os olhos, não vai vingar”, enfatiza Marcelo Homen de Mello (SP), consultor de desenvolvimento humano, organizacional e coaching.
* Parte de matéria de capa sobre Crowdfunding, produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Janeiro/ 2014, número 165.
