
Em 2008, o NX Zero lançou versos profundos na música “Cedo ou tarde” numa homenagear in memoriam para o pai do guitarrista e back vocal, Gee Rocha. A canção, que declama o desejo de encontra-lo em algum momento e confiante que o olha e escuta com orgulho mesmo não estando presente. Assim como o artista, outros já haviam resgatado a figura paterna em composições expressivas que se tornaram simbólicas e caíram na boca do povo como a música imortal “Pai” do cantor Fábio Jr, de 1997: “Pai, Você foi meu herói meu bandido. Hoje é mais muito mais que um amigo. Nem você nem ninguém tá sozinho. Você faz parte desse caminho. Que hoje eu sigo em paz”. Esta imagem masculina do núcleo familiar vai de encontro atualmente à normativa social, que determina que o amor de mãe é mais forte que tudo e imutável. Apesar de para muitos a relação dos filhos com o genitor só nasce e cresce com o passar do tempo, ele mantém um protagonista importante e fundamental no cenário social, e não obstante no contexto do mercado publicitário. “As campanhas que abordavam os pais e ou famílias anteriormente, sempre utilizavam a imagem da família tradicional e constituída dentro dos padrões da época. Hoje, muitas marcas têm percebido que esta família tradicional não representa em sua totalidade a família moderna”, destaca Camila Leoni, sócia-diretora da LB Comunica. Diante disso, o seu afeto é tão grande e relevante quanto ao da figura materna. A realidade atual mostra que esta retórica está ultrapassada e que não basta ser pai, tem que participar.
Contudo, sua posição vai além de um mero ajudante e se constitui como um agente na formação de caráter, na constituição do sentimento de segurança, no desenvolvimento de uma força para superação dos desafios. Este amado herói está cada vez mais presente na propaganda moderna que mostra a relação de pais e filhos e sua importância no desenvolvimento do nosso futuro. No passado, criaram-se apelos que destacavam a necessidade de satisfazê-lo com a aparência que se admirava como no caso da Gillete (1960). Propagandas sempre enfatizaram que no Dia dos Pais eles mereciam a praticidade de produtos modernos ofertados pela Unilojas (1970); o conforto para os pés proporcionado pelas Sandálias Franciscano (1977); e a conexão a qualquer hora dos primeiros modelos de celular Nokia, surgidos em meados dos anos 90, com o suporte de diversos garotos propagandas como Pelé, Rubens Barrichello, entre outros. “Lembro de uma campanha da Gillette onde o pai fazia a barba junto com o filho, na verdade o filho só ficava cheio de espuma e repetia os movimentos do pai!! Essa ideia de querer ser como o pai, de aprender com ele me marcou”, diz o consultor Raúl Ranauro Javales Júnior da Zielen (SP).
Em 1992, a Gillette colocou no ar comercial intitulado como “Pai e Filho”, onde resgatava a imagem de um jovem pai fazendo a barba sob os olhos curiosos de seu garotinho que o observa com orgulho. No finalzinho, repetia-se o bordão Tchan, tchan, tchan, tchan! lançado em 1980 pela marca. O filme integrou um projeto de sucesso iniciado 10 anos que fazia referência ao produto com duas lâminas que representava facilidade e economia para se barbear, comprovando a qualidade da linha Prestobarba. “As abordagens em geral tentavam colocar os pais num patamar semelhante de importância com as mães, sempre mexendo com a autoestima”, Gustavo Queiroz – presidente do Sinapro-Bahia e co-presidente da Agência Morya. Nesta época, a publicidade passou cada vez mais a enfatizar as diversas perspectivas do papel do homem na criação e no envolvimento com as crianças, destacando que o amor de pai também é único e especial. Em 1992, o Banco Itaú mostrou em campanha de Seguros com uma mensagem simples e cheia de emoção as altas expectativas de um pai para ter um filho: “Esse sujeito vai roubar sua esposa, suas noites de sono, e ainda assim você vai ser completamente louco por ele”.
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De forma bastante enfatiza, a campanha também mostrava uma nova perspectiva da comunicação para a figura paterna, que ainda não mantinha o mesmo peso em termos de ações específicas em comparação aos investimentos para o Dia das Mães, por exemplo. “Geralmente as campanhas em homenagem ao Dia dos Pais sempre valorizam a figura do pai sob o ponto de vista emocional, que é muito bacana e envolvente”, destaca Camila. Para a especialista, as campanhas buscam mais a parte emocional e, atualmente, têm explorado até o lado mais sensível do homem. E esta é a grande transformação que se abateu na propaganda voltada à imagem paterna. “Há uma campanha que me marcou, e que foi a de um pai que brincava com a filha pequena assim que chegava do escritório, mesmo cansado após um dia inteiro de trabalho. Isso me lembrou muito a minha relação com o meu pai, na minha infância”, completa Leoni.
Propagandas como essas mostram outro lado do pai que vai além da imagem daquele protetor. Um exemplo é o filme “Pai é pai”, produzido pela Sprite (com título “Dad’s Love”), que reforça a nova realidade de ser pai de menina no espírito da brincadeira preferida de toda garotinha. Com muito bom humor e delicadeza, o comercial de 30” com a música To Love Somebody do Bee Gees, apresentava o que um pai é capaz de fazer, sem se importar com o que outros pensam. A campanha para o Sprite Light, criada em 2008, trabalha com tanta sensibilidade que o amor entre pai e filha é retratado sem qualquer palavra, contando uma rotina de ter uma menina om cenas cotidianas, acompanhada da música “To Love Somebody” na trilha sonora. “As campanhas têm buscado mostrar uma certa diversidade da figura do pai dentro deste composto familiar e seu novo e abrangente papel na relação com seus filhos”, lembra Leoni.
As campanhas criadas para o Dia dos Pais passaram cada vez mais a emocionar em relação as linguagens abordadas, anteriormente, e como estão hoje. Esta era a nova construção deste relacionamento, refletido com apelos mais realista sobre a mudança do papel moderno da paternidade. “Esta relação envolve muita emoção e força e um trabalho que me emocionou por caracterizar esta mensagem é a campanha da marca ‘Gelol. Não basta ser pai’. Ela mexia com o ‘sentimento de culpa’ de todo pai de não ser muito presente. Pegava todo mundo!”, lembra.

Produzida em 1984, por Duda Mendonça, a propaganda da marca destacou que a relação dos filhos com os pais é de companheirismo e sua presença nos momentos mais importantes é tão fundamental que ajuda a se deixar abater pelos percalços da vida, com um slogan que se tornou um dos maiores chavões que conhecemos: “Não basta ser pai, tem que participar. Não basta ser remédio tem que ser gelol”. Essas são algumas das experiências que mostram que há muito amor envolvido nas homenagens a eles pelo Dia dos Pais e refletem que os papéis não são tão distintos como se acredita.
gelol2“Hoje, vemos que a propaganda está muito mais ‘mundo real’ e refletindo o cotidiano. Apelos hoje ligados ao comportamento e ao fortalecimento do conceito de família, apesar do consumo proposto por trás. Algumas propagandas se tornaram até institucionais, sem produto específico como a da Natura que citei acima. Os pais se vêem na propaganda de hoje. Ser um pai herói agora é conseguir criar e educar um filho em um mundo atribulado em que vivemos, e repassar os valores nessa educação, a identificação é muito mais forte”, destaca Raul Javales. De fato, os novos tempos criaram um novo cenário social em que a participação é mais ampla, pois a divisão das tarefas e das responsabilidades entre pais e mães estão ficando cada vez mais igualitárias, fugindo do estigma da mulher como a total referência na criação das crianças. Naturalmente, as mudanças nos papeis tradicionais complementam essas posturas da paternidade moderna.
“Acho que as campanhas se modernizaram muito, hoje mais ligadas a uma igualdade de gêneros, não diferenciando tanto pai e mãe. Antes era muito ligado a ser como o pai e as propagandas focavam mais em filho homem, com o pai. Hoje também se abriu espaço para um novo conceito de família onde um filho pode ter dois pais ou duas mães, e tudo é positivo”, completa Ranauro. Ele se recorda ainda de outra campanha bem interessante que foi muito pouco veiculada: “Natura Pais”. Criada ano passado pela África, o trabalho reuniu um público de mais de 30 mil pessoas em um estádio em São Paulo, numa ação que exibisse a emoção entre filhos e seus heróis em uma homenagem surpresa. A campanha digital para o Dia dos Pais da Natura, desenvolvida pela agência Salve, focou-se em oito pais que foram surpreendidos com depoimentos no telão dos filhos os homenageando no intervalo de um jogo de futebol.
Com o mote “Chame o abraço do seu herói preferido”, a campanha apresenta a importância da relação do filho com o pai numa investida ousada e cara da marca, que apostou de forma sensível e emocionante na ideia de que este amor fraternal não tem idade e que nunca é tarde para prestigiar aqueles que estiveram do seu lado à vida toda. “Com a redução dos investimentos o Dia dos Pais perdeu força, em minha opinião. Hoje não temos mais tantas campanhas focadas no dia dos pais e as marcas estão centrando força em datas mais fortes como mães e Natal”, reforça Gustavo Queiroz. Mudanças mostram outro lado do Dia dos Pais em campanhas pautadas na sensibilidade e emoção.
* Matéria perfil produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Agosto/ 2016, número 196
