A propaganda se reinventou, ousou e marcou história na década 80. O apelo emocional permeou as ações de várias marcas que apostou nos sentimentos de conforto e de alegria junto a família para criar uma relação com o público, como a Faber Castell, criada em 1761. Uma das fórmulas para se manter em vigor no mercado por mais de três séculos foi a capacidade de se reinventar. E foi isso o que ela fez na época, quando a concorrência do mercado se acirrava, e nesta investida nasceram comerciais belíssimos como “Companheiro” (1980) com a música Caderno de Toquinho, e repetiu a receita de sucesso com o músico em 1983 com a composição “Aquarela”, ambos com 60”.
Apesar do impacto dos filmes, o comercial que ficou mais conhecido foi o segundo, que é considerado até hoje um dos mais marcantes e inovadores da publicidade brasileira. “Tenho na mente até hoje o comercial dos lápis Faber Castell, por causa da musica Aquarela do Toquinho, e por ter uma animação linda!”, lembra a publicitária Andrea Fonseca, diretora de produção da Artecetera Comunicação Integrada (AL).
Com animação da Start Filmes, o VT foi criado pela Full Jazz, que detinha a conta da Faber-Castell, e que resolveu apostar em elementos lúdicos interligados com um mundo real. O resultado: relação emocional com as mães e com as crianças, através da música, segundo uma pesquisa com crianças de 10 a 12 anos e mães. “Quando penso em propagandas, lembro de três imediatamente. A primeira delas é a da Faber Castell que, ao som da música Aquarela do Brasil, traz animações infantis que se formam de acordo com canção do Toquinho, proporcionando a sensação nostálgica da infância. Já a campanha do Guaraná Antarctica, ‘Pipoca com Guaraná’, gruda na gente com aquele jingle. E, por último, os icônicos filmes dos bichinhos da Parmalat e seu ‘Tomou?’ que marcaram a época e viraram febre nacional. São três grandes e inesquecíveis comerciais”, comenta o sócio e produtor executivo da paulista Consulado, Tomás Gurgel.
Os anos 80 ainda ficaram marcados por uma grande transformação no mercado publicitário, que, desde os tempos do rádio e dos cinejornais, não trabalhava com a imagem do negro como protagonista. No final desta década, o país abriu espaço para o primeiro garoto-propaganda afro-brasileiro de sua história: o Sebastian, personagem que despontou nas campanhas “AbuseUse C&A”. Incorporado pelo ator, cantor e bailarino mineiro Sebastião Aparecido Fonseca, participou de vários musicais e comerciais, até estrelar como a imagem da rede de lojas de departamentos. “O Abuse Use C&A era sempre divertido com um garoto propaganda adorável e marcante! Sucesso! Da mesma forma, o comercial da Faber-Castell foi muito marcante com a música Aquarela do Toquinho. Muito lindo! Genial”, lembra Lissandra Sousa, produção da Promma Promoção & Marketing (AL).
Partiu do time da Avanti, house a agency da C&A, liderado na época pelo publicitário Woody Gebara, o projeto audacioso de chacoalhar os comerciais da época com um bordão simples e fácil de decorar, com muita animação, em cima de um único personagem, que proporcionasse simpatia e identificação positiva com o público. A escolha inicial partiu do desafio de aproximar a marca cada vez mais com a população, em sua maioria afro-brasileira, com elementos inovadores e irreverentes. Então, os criativos se inspiraram em conceitos inovadores do cinema e da música como a cantora Grace Jones e o filme “Os irmãos cara de pau”.
Misturando-se todos esse ingredientes, o trabalho passou a ser um sucesso com a presença e carisma do Sebastian, o cenário teatral do primeiro Vt e o vozeirão no melhor estilo do jazz cantando a música que virou a “marca” da marca: “Atenção pra vocês eu vou cantar, o que é o AbuseUse C&A. São quinhentas ofertas para você abusar, seja na Tv e no rádio, seja onde você escutar. AbuseUse C&A. Essa moda vai pegar. É isso aí, você não perde por esperar!”. Naturalmente, no decorrer dos anos, alguns mistérios rondaram o conceito da comunicação adotada, até a revelação por exemplo da verdadeira voz por trás dos comerciais “Abuse e Use”, o timbre rouco e frenético era do cantor e locutor Josias Damasceno, um dos músicos mais requisitados pelas produtoras de som publicitário em virtude de sua versatilidade vocal. Contudo, isso não tirou o brilho deste bem sucedido case da propaganda, que durou 20 anos.
* Parte de matéria de capa produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Novembro/ 2015, número 187

