A vida nunca foi tão divertida e colorida no Brasil quanto nos anos 80, período em que o país respirava os primeiros momentos de liberdade, após os tempos conturbados de censura, repressão e ditadura do regime militar. Esta abertura se refletia especialmente no cenário da comunicação com os avanços observados, por exemplo, nos meios de comunicação e no setor da propaganda. Nesta época observamos mudanças editoriais e assistimos o início do amadurecimento deste mercado brasileiro, com a afirmação e expansão do fenômeno da segmentação com as revistas para públicos específicos como os jovens (Revista Pop) e as masculinas, por exemplo, como Playboy, Ele & Ela e Status. A Tv brasileira também se destaca cada vez mais como uma diversão fundamental para toda família e trazendo como novos pilares, o entretenimento e o jornalismo, em uma estrutura mais solidificada e sofisticada com vinhetas, chamadas, apresentações de programa e quadros dentro de programas.
Chamada de “a década da consolidação”do marketing no Brasil, os anos 80 marcaram antes de tudo a transformação do processo de criação e de aplicação dos negócios em propaganda que passaram a ser desenvolvidos de acordo com técnicas de planejamento, vendas, distribuição e comunicação que fizeram a história da publicidade da época e traçaram a trajetória de diversas marcas e ainda sua relação com o mercado. “Quando busco na memória algo em comunicação que me marcou, lembro de um período em que as marcas ‘brigavam’ de verdade pelos consumidores, uma provocação mútua na qual se destacava a mais criativa, a mais inteligente, a melhor. Até hoje não consigo dizer quem venceu: Estadão ou Folha? Coca-Cola ou Guaraná Antarctica? Brahma ou Antarctica? Pepsi ou Coca-Cola? Bombril ou a Concorrente? Era uma época em que a coragem do cliente falava tão alto quanto a criatividade e a inteligência da agência. Coragem para ter a irreverência de levar a público uma reclamação da Concorrente, como no caso de Mon Bijou (Bombril).Coragem de colocar a marca da concorrente em seu espaço publicitário apenas para mostrar que é realmente superior”, lembra Sergio Barros, diretor de criação da Innova – All Around The Brand (SP).
Para o profissional, um dos grandes diferenciais do trabalho da época era a forma criativa e sempre bem humorada de criar essa disputa, fazendo com que o público se entrosasse com essa “guerra de marcas” nas campanhas de Coca-Cola versus Guaraná Antarctica ou Pepsi (EUA) e de Estadão versus Folha. “Era uma coragem que tornava o intervalo comercial divertido de assistir, envolvente. Tão envolvente que me despertou o interesse para essa área, e que hoje me parece um pouco esquecida. Tanto nas agências, que pecam muitas vezes em apresentar ‘o que o cliente aprovaria’ em vez de provocar uma inquietação, quanto no cliente de acreditar quando uma agência apresenta algo realmente novo, destaca.
Pivô de uma das brigas mais famosas do segmento de bebidas, a Coca-cola era o reflexo na época do que representava a juventude descolada e tudo isso era expressado por comerciais criativos, que eram seguidos por outros igualmente bacanas de concorrentes, especialmente no mercado norte-americano. Com o mote “Cola Cola é isso aí”, que perdurou por mais de cinco anos (1982-1989), a marca adotou nesta época uma estratégia chamada de “Adoção de risco inteligente”, criada por Roberto C. Goizueta, presidente da diretoria e CEO da The Coca-Cola Company.
Sucesso e fracassos dessas ações a parte, as campanhas foram um verdadeiro show com trilhas inesquecíveis. Afinal, quem não lembra daqueles comerciais bacanas com uma turma jovem e feliz embalada pela canção: “É isso aí. O jeito de viver. O sabor que é pra valer. Coca-cola é que faz tudo mais ser assim. Alegria para você e pra mim. Coca-cola é isso aí. Não tem sabor como esse aqui. É demais. Refresca muito, muito mais”. Com orações simples porém emocionantes, levava todos a considerar o frescor que a bebida poderia proporcionar.
* Parte de matéria produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Novembro/ 2015, número 187
