Na década de 60, o mundo mudava em diversos aspectos. A União Soviética mandava o primeiro homem ao espaço sideral, Yves Saint Laurent abria seu próprio portfólio e o presidente John Kennedy era assassinado, contudo, muita coisa também acontecia no “país do futebol”, que conquistara em 1962, pela segunda vez a Taça Jules Rimet, na final da 7ª Copa do Mundo. Nesta época, o Brasil foi marcado por diversas rupturas no processo político, na moda e na música com o nascimento da Bossa Nova, o avanço da Jovem Guarda e a chegada do Tropicalismo, por exemplo. Mas, antes de tudo, mudamos enquanto sociedade de consumo diante de uma conjuntura conturbada e que pouco conhecia sobre gasto em larga escala e opções em ponto de venda. E é neste cenário que conhecemos a nova indústria da publicidade, que passa a ter um papel indispensável trazendo tempos que não voltariam mais, com as imagens atraentes da mídia televisiva, que trouxeram comerciais que impactaram uma geração.
“A publicidade trabalha a lógica midiatizante de um sentido que valoriza o hedonismo nas culturas de consumo, mesclando-se aos imaginários locais e mundiais conforme a abrangência de atuação das marcas. E isso só faz sentido porque é algo que se pauta na sensibilidade e nas percepções individuais, a partir de elementos que criam pertencimento e pertinência aos contextos de circulação midiática”, comenta o professor em Publicidade e Propaganda da ECA da Universidade de São Paulo (SP), Eneus Trindade. Com a mudança de contexto da propaganda observamos que a história da comunicação moderna tem seu começo neste período, e se mostra com muita criatividade e simpatia em especial pela popularidade que jingles associados com as imagens televisivas causaram para o espectador.
Espuma embelezadora – No começo dos anos 60, a propaganda ainda estava se adaptando ao meio televisivo, com uma forte herança da cultura radiofônica. E isto era visível em algumas campanhas, em especial dos Sabonetes Gessy (1913), pioneira no ramo da higiene pessoal, que apostou em cantoras da “Era do Rádio”. E esta foi uma estratégia eficaz na década de 60. No comercial para a marca, as estrelas apresentavam os benefícios do sabonete em uma depois comunicação dirigida quase que exclusivamente ao público feminino. Da mesma forma estratégica, apostou em outras ações de comunicação como a promoção. “Acredito que fui abduzido pelo mundo da promoção ainda muito jovem, mais precisamente aos 6 ou 7 anos de idade. Na época, pelo que me lembro, a Gessy lançou uma campanha promocional (ainda não se falava em Marketing Promocional, muito menos em Live Marketing!), no qual o consumidor tinha a oportunidade de ganhar um carro se encontrasse a chave dentro do sabonete. Como era uma enorme novidade, minha querida mãe fez as compras do mês investindo em dezenas de sabonetes, ganhar aquele carro seria a liberdade na mobilidade da família. Não sei detalhar quantos sabonetes ela comprou, mas sei que quando fiz 10 anos, ainda tomava banho com sabonete pela metade, pois ela havia cortado todos para achar a chave do sonho”, comenta Kito Mansano, sócio da agência Rock Comunicação (SP).
Soninho – “Aquele desenho dos Cobertores Parahyba era a última coisa que podíamos assistir na TV, quando crianças, pois anunciava que era hora de ir dormir (no sul, claro!). Aqui não se usam cobertores. Era lindo demais. Doce lembrança”, diz a sócia diretora da Artecetera Comunicação Integrada, Lia Fonseca (AL), que relembra os comerciais populares que marcaram a infância de muitos em 1961. O bordão (“Já é hora de dormir, não espere mamãe mandar”) ficou marcado como um lembrete para muitos e consolidou a empresa de produtos para cama que projetou o conceito de tradição e qualidade, desde sua fundação em 1925.
Xô inverno – “Além dos comerciais dos Cobertores Parahyba, tenho na mente até hoje o das Casas Pernambucanas com o mote ‘Quem bate? É o frio’, pois sempre que o inverno chegava lá no Sul e em SP, a campanha começava”, lembra Andrea Fonseca, diretora de produção também da Artecetera Comunicação Integrada. E não à toa. A propaganda com a música “Não adianta bater, eu não deixo você entrar”, criada pelo Heitor Carreiro e produzido pela Magi Som e pela Lynx Film (produtora de vídeo), em 1962, para a rede varejista, ficou tão irresistível na época que se manteve na mídia radiofônica e televisiva por toda a década, e está categorizada como um dos jingle mais lembrados.
O mercado está cheio desses tops cases que nos faz relembrar como a propaganda nos empolgou, encantou e nos marcou até hoje. Os jingles são reconhecidos e corroboram a importância do Music Branding nas estratégias de comunicação, trazendo nestes casos diversas memórias que nos posicionam diante de situações, que mostram que em alguns casos estamos sempre voltando ao passado.
* Matéria produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Setembro/ 2015, número 185

